A CRIANÇA QUE VIROU SERPENTE
Contou-me a amiga Alzira Prado Schon uma história ocorrida em Campos do Jordão. Ela jura que é verdadeira porque a assistiu no bairro Jardim do Embaixador lá nos idos dos anos 40. No local havia uma permanente erosão, onde a terra escorria dos barrancos sem cessar, todos os dias, os de sol e os de chuva. A área ficava defronte à residência do saudoso Domingos De Santi. Os moradores começaram a ficar amedrontados com o fenômeno, onde a terra se movia sem causa aparente nem explicável. Os pais não deixavam as crianças brincar naquela área que era tida como mal assombrada, porquanto ninguém conseguia descobrir a causa da terra movediça que escorria do plano mais elevado para o inferior. “É coisa ruim!†Diziam alguns. “O lugar é amaldiçoado!†diziam outros.
Certa vez o bispo de Taubaté resolveu subir a serra para fazer o Crisma de dezenas de crianças jordanenses, decidindo celebrar uma missa campal lá no Jardim do Embaixador. Por isso, no dia marcado, ali se reuniram centenas de pessoas, entre pais, avós e a parentela toda para assistir a confirmação do Batismo e a missa campal. Contaram ao bispo a ocorrência daquele fenômeno telúrico inexplicável onde a terra se movia há muito tempo, assustando a população do bairro. Depois da cerimônia religiosa e do Crisma da criançada, o bispo explicou que aquele fenômeno só tinha uma explicação: “alguém depositara naquela local uma criança sem ser batizadaâ€. A criança que não recebera o sacramento do Batismo, transformara-se em serpente, que vivia revolvendo a terra, dias após dias, sem parar. O prelado comunicou aos presentes que iria batizar aquela criança, que no local fora depositada, quando então a movimentação da terra cessaria para sempre, porque a serpente iria desaparecer. Mas avisou: “Depois de batizada a criança, ela procuraria imediatamente o seio da sua mãe sanguÃnea, de onde ela foi gerada. A afirmação do religioso assustou as famÃlias ali concentradas para a missa campal. Surtiu o efeito de uma bomba caÃda do céu, pois não ficou ali uma mulher sequer para ouvir o resto da história. A mulherada retirou-se do local em desabalada carreira. Só ficaram algumas crianças como dona Alzira que a tudo assistiu. Não queremos crer que alguma mulher que assistia a missa campal tivesse cometido algum pecado mortal, como o de ter sofrido um aborto no local mal-assombrado, ou de ter depositado ali o corpo de algum recém nascido rejeitado. Não. Absolutamente, não. Entretanto, uma pergunta ficou latejando em nossa cabeça: por que não ficou uma mulher sequer naquele local para aguardar o batismo da criança que retornaria aos braços de sua mãe?
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